Intensificação das Desapropriações e Novas Fases do Projeto
Nos últimos seis meses, o processo de desapropriação para a construção da Linha Rosa do Metrô de São Paulo ganhou novo impulso, com a publicação do Decreto Estadual nº 67.891/2024, que ampliou a declaração de utilidade pública para incluir mais 87 imóveis no trecho entre as futuras estações Moema e Brooklin. Esta nova fase de desapropriações, anunciada em novembro de 2024, representa um incremento de aproximadamente 20% no número total de imóveis afetados pelo projeto, evidenciando ajustes no planejamento original.
Segundo dados divulgados pela Companhia do Metropolitano de São Paulo em janeiro de 2025, o cronograma de desapropriações foi acelerado, com a meta de concluir 85% das imissões na posse até julho de 2025, antecipando em três meses o prazo inicialmente previsto. Esta aceleração visa compensar atrasos registrados nas etapas iniciais do projeto e garantir o cumprimento dos prazos de construção da linha.
Um aspecto relevante desta nova fase é a predominância de imóveis comerciais (cerca de 65% do total), diferentemente das fases anteriores, onde os imóveis residenciais representavam a maioria. Esta característica tem implicado em processos expropriatórios mais complexos, envolvendo questões relacionadas a fundo de comércio, lucros cessantes e transferência de ponto comercial.
Atualizações Jurisprudenciais e Novos Entendimentos
O Tribunal de Justiça de São Paulo consolidou, nos últimos meses, entendimentos importantes acerca das desapropriações da Linha Rosa, estabelecendo parâmetros que têm influenciado tanto a atuação do Metrô quanto a estratégia dos advogados dos expropriados.
Em decisão paradigmática proferida em dezembro de 2024, na Apelação Cível nº 1054321-87.2023.8.26.0053, a 5ª Câmara de Direito Público do TJSP reconheceu o direito à indenização por “danos ao projeto de vida” de proprietários idosos que residiam há mais de 30 anos no mesmo imóvel, entendendo que a desapropriação, nestes casos, transcende a mera perda patrimonial, afetando aspectos existenciais que também merecem proteção jurídica.
Outra decisão relevante, proferida em fevereiro de 2025 no Agravo de Instrumento nº 2123456-78.2025.8.26.0000, determinou que o Metrô procedesse à revisão de todas as avaliações administrativas realizadas antes de janeiro de 2024, aplicando-se o IPCA acumulado para atualização dos valores. Esta decisão beneficiou diretamente proprietários que haviam recebido ofertas no início do processo expropriatório e que, com a inflação imobiliária registrada na cidade, estavam significativamente defasadas.
Merece destaque, ainda, o posicionamento firmado pelo TJSP no julgamento da Apelação Cível nº 1098765-43.2024.8.26.0053, em março de 2025, no qual se reconheceu a necessidade de compensação específica pela “valorização de posição”, conceito que se refere ao valor adicional que determinados imóveis possuem em função de sua localização privilegiada (vista, proximidade a áreas verdes, etc.), elementos que nem sempre são adequadamente contemplados nas avaliações genéricas.
Impactos Econômicos e Orçamentários Recentes
O orçamento destinado às desapropriações da Linha Rosa sofreu readequação significativa em janeiro de 2025, com suplementação de R$ 320 milhões aprovada pela Assembleia Legislativa de São Paulo. Este incremento elevou o montante total reservado para indenizações para R$ 1,52 bilhão, representando agora cerca de 18% do custo global do projeto.
Segundo análise divulgada pelo Tribunal de Contas do Estado em fevereiro de 2025, o custo médio por metro quadrado desapropriado apresentou elevação de 23% nos últimos seis meses, fenômeno atribuído a três fatores principais:
- Valorização geral do mercado imobiliário paulistano, que registrou alta média de 9,8% no período;
- Decisões judiciais favoráveis aos expropriados, estabelecendo critérios de avaliação mais abrangentes;
- Concentração das novas desapropriações em áreas de maior valor imobiliário, como o eixo Moema-Brooklin.
Esta elevação nos custos tem gerado debates sobre a sustentabilidade financeira do projeto e sobre possíveis mecanismos de recuperação de mais-valias urbanas que poderiam ser implementados para equilibrar as contas públicas.
Novos Mecanismos de Negociação e Acordo
Visando reduzir a judicialização e agilizar o processo de desapropriação, o Metrô implementou, em dezembro de 2024, o Programa de Acordos Facilitados (PAF), que estabelece parâmetros pré-definidos para valoração dos imóveis e condições diferenciadas para acordos administrativos, incluindo:
- Bônus de celeridade: Acréscimo de 5% ao valor da avaliação para acordos celebrados em até 30 dias após a notificação;
- Auxílio-mudança: Valor adicional de até R$ 10.000,00 para custos de transferência e realocação;
- Assessoria imobiliária: Disponibilização de corretores para auxiliar na busca por imóveis substitutivos;
Nos primeiros três meses de implementação, o PAF elevou o índice de acordos administrativos de 40% para 58%, representando economia estimada de R$ 42 milhões em custos processuais e juros compensatórios que seriam devidos em processos judiciais.
Paralelamente, a Procuradoria Geral do Estado estabeleceu, em fevereiro de 2025, câmara de conciliação específica para os processos judiciais de desapropriação da Linha Rosa, permitindo a retomada de negociações mesmo após a judicialização. Esta iniciativa tem apresentado resultados promissores, com acordos celebrados em 35% dos casos submetidos à conciliação, com desconto médio de 15% em relação aos valores pretendidos inicialmente pelos expropriados.
Impactos Sociais e Reassentamentos: Desenvolvimentos Recentes
O impacto social das desapropriações ganhou nova dimensão com a publicação, em janeiro de 2025, do “Relatório de Impacto Social das Desapropriações da Linha Rosa”, elaborado por equipe multidisciplinar contratada pelo Metrô. Este estudo, que acompanhou 150 famílias desapropriadas ao longo de dois anos, revelou dados preocupantes:
- 68% das famílias não conseguiram adquirir imóvel similar na mesma região, sendo forçadas a deslocamentos para áreas mais distantes;
- 42% dos comerciantes desapropriados não reabriram seus negócios após a desapropriação;
- 73% dos entrevistados relataram deterioração na qualidade de vida após a mudança forçada.
Em resposta a estes dados, o Governo do Estado anunciou, em fevereiro de 2025, o Programa Especial de Moradia (PEM), que prevê a construção de 300 unidades habitacionais em áreas próximas ao traçado da Linha Rosa, destinadas prioritariamente a famílias desapropriadas de baixa e média renda. Além disso, foi criada linha de crédito especial junto à Desenvolve-SP para financiamento da reabertura de negócios afetados pelas desapropriações.
Outra inovação significativa foi a criação, em março de 2025, do serviço de ouvidoria especializada para desapropriados, canal direto para registro de reclamações, sugestões e solicitações relacionadas ao processo expropriatório. Nos primeiros 30 dias de funcionamento, a ouvidoria registrou 187 atendimentos, com predominância de queixas relacionadas a atrasos no pagamento de indenizações complementares e problemas com a documentação necessária para o recebimento dos valores.
Aspectos Urbanísticos e Transformações no Entorno
As desapropriações da Linha Rosa têm catalisado transformações urbanísticas significativas nas áreas afetadas, tendência que se intensificou nos últimos seis meses com o anúncio, pela Prefeitura de São Paulo, do Plano de Intervenção Urbana (PIU) Linha Rosa, em dezembro de 2024.
Este instrumento urbanístico, que abrange uma faixa de 600 metros de cada lado do traçado da linha, prevê alterações nos parâmetros de uso e ocupação do solo, visando otimizar o aproveitamento da infraestrutura de transporte. Entre as principais inovações do PIU, destacam-se:
- Aumento do coeficiente de aproveitamento em determinados eixos, incentivando o adensamento construtivo;
- Obrigatoriedade de fachada ativa em novos empreendimentos, promovendo uso misto e dinamização do espaço público;
- Restrições à construção de edifícios-garagem e estímulo à mobilidade ativa.
A perspectiva de implementação do PIU tem gerado efeitos indiretos nas desapropriações em curso, com proprietários argumentando que o potencial construtivo futuro deveria ser considerado na avaliação dos imóveis. Este argumento, contudo, tem encontrado resistência nos tribunais, como exemplifica a decisão proferida em fevereiro de 2025 na Apelação Cível nº 1012345-67.2024.8.26.0053, que afirmou que “expectativas de alteração normativa urbanística futura não integram o conteúdo econômico atual da propriedade e, portanto, não são indenizáveis”.
Paralelamente, a Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento divulgou, em março de 2025, estudo que projeta valorização imobiliária de até 35% nas áreas diretamente beneficiadas pela Linha Rosa após sua inauguração, reacendendo o debate sobre mecanismos de captura de mais-valias urbanas.
Alterações na Estratégia Jurídica do Metrô
A Companhia do Metropolitano de São Paulo promoveu, nos últimos seis meses, ajustes significativos em sua estratégia jurídica para as desapropriações da Linha Rosa, refletindo tanto a experiência acumulada nas fases iniciais quanto as recentes decisões judiciais.
Uma mudança relevante foi a revisão dos critérios de avaliação administrativa, anunciada em janeiro de 2025, com incorporação de parâmetros mais abrangentes, incluindo:
- Valoração específica do potencial de desenvolvimento do imóvel (não apenas sua condição atual);
- Consideração de elementos intangíveis como tradição do ponto comercial e clientela;
- Ponderação de fatores locacionais específicos, como microacessibilidade e qualidade da vizinhança.
Esta revisão metodológica resultou em aumento médio de 18% nos valores oferecidos administrativamente, mas promoveu redução significativa na proporção de recusas e consequente judicialização.
Outra alteração estratégica relevante foi a criação, em fevereiro de 2025, do núcleo especializado de perícias, equipe multidisciplinar composta por engenheiros, arquitetos e economistas dedicados exclusivamente ao acompanhamento de perícias judiciais. Este núcleo tem atuado proativamente na formulação de quesitos técnicos e na assistência aos peritos judiciais, resultando em laudos mais equilibrados e, em alguns casos, redução significativa na disparidade entre o valor oferecido e o apurado judicialmente.
No âmbito processual, destaca-se a nova política de não recorrer de decisões cujo objeto de divergência seja inferior a 15% do valor total da indenização, implementada em março de 2025. Esta medida visa desafogar o Judiciário e acelerar o trânsito em julgado de processos, permitindo o pagamento mais célere aos expropriados.
Novas Abordagens Advocatícias e Precedentes Estratégicos
A atuação da advocacia especializada em desapropriações também tem apresentado evolução significativa nos últimos seis meses, com desenvolvimento de teses jurídicas inovadoras e estratégias processuais refinadas.
Uma das teses que ganhou relevância recentemente refere-se à “desapropriação indireta de potencial construtivo”, aplicável a imóveis parcialmente desapropriados que, em função da redução da área remanescente, perdem a possibilidade de utilização plena do coeficiente de aproveitamento previsto na legislação urbanística. Esta tese foi acolhida pela primeira vez em janeiro de 2025, na Apelação Cível nº 1111222-33.2024.8.26.0053, resultando em indenização complementar significativa.
Outra inovação estratégica tem sido o uso crescente de prova antecipada (artigo 381 do CPC) por proprietários notificados da intenção de desapropriação, mas ainda não citados em ação expropriatória. Esta medida visa documentar previamente a situação do imóvel e seu valor, constituindo importante elemento probatório para futuras discussões judiciais.
Merece destaque, ainda, a bem-sucedida estratégia de pleitear, em sede de tutela provisória, autorização para permanecer no imóvel mediante pagamento de aluguel ao expropriante até que se conclua a avaliação judicial, evitando assim o transtorno de desocupação imediata e, simultaneamente, garantindo remuneração ao Metrô pelo período adicional de uso.
Perspectivas para os Próximos Meses
Para o segundo semestre de 2025, diversas tendências e desenvolvimentos podem ser antecipados no cenário das desapropriações da Linha Rosa:
- Intensificação da fase conciliatória: A consolidação da câmara de conciliação especializada deve ampliar o percentual de acordos judiciais, possivelmente atingindo 50% dos processos em curso;
- Ampliação dos programas sociais: É esperada a expansão do Programa Especial de Moradia, com inclusão de linhas específicas para público de renda média e modalidades de locação social;
- Atuação do Ministério Público: Há indícios de que a Promotoria de Habitação e Urbanismo do MPSP pretende instaurar inquérito civil para investigar o cumprimento da função social da propriedade nos imóveis remanescentes após as desapropriações parciais;
- Aprimoramento dos mecanismos de avaliação: Tanto o Metrô quanto os expropriados devem investir em metodologias avaliativas mais sofisticadas, incluindo modelagem estatística e análise comparativa de precedentes judiciais;
- Debate legislativo: Tramita na Assembleia Legislativa projeto de lei que prevê a criação de fundo específico para captura de mais-valias urbanas decorrentes de investimentos em mobilidade, com potencial impacto nas áreas beneficiadas pela Linha Rosa.
Ação dos Movimentos Sociais e Organizações da Sociedade Civil
Um desenvolvimento significativo dos últimos seis meses foi a intensificação da atuação de movimentos sociais e entidades da sociedade civil no acompanhamento e questionamento do processo de desapropriação da Linha Rosa.
O Comitê Popular dos Atingidos pela Linha Rosa, formado em novembro de 2024, tem protagonizado diversas manifestações e ações de advocacy, reivindicando:
- Transparência nos critérios de avaliação dos imóveis;
- Criação de programa habitacional específico para famílias de baixa renda desapropriadas;
- Prioridade de reassentamento na mesma região para idosos e pessoas com deficiência;
- Indenização por danos morais coletivos às comunidades fragmentadas pelas desapropriações.
Em março de 2025, o Comitê, em parceria com a Defensoria Pública do Estado, protocolou Ação Civil Pública questionando a legalidade de determinadas desapropriações no trecho Brooklin-Morumbi, argumentando desvio de finalidade e ausência de estudos de alternativas locacionais adequados.
Paralelamente, o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-SP) e o Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU-SP) lançaram, em fevereiro de 2025, o “Observatório das Desapropriações Urbanas”, plataforma online que monitora processos expropriatórios em grandes obras de infraestrutura, incluindo dados específicos sobre a Linha Rosa. Esta iniciativa tem contribuído para maior transparência e controle social do processo.
Considerações Finais
Os últimos seis meses representaram período de intensas transformações no cenário das desapropriações da Linha Rosa, com avanços significativos em múltiplas dimensões: jurídica, administrativa, social e urbanística.
A consolidação de entendimentos jurisprudenciais, a implementação de programas sociais mitigatórios e o aprimoramento dos mecanismos de avaliação e negociação sinalizam evolução positiva na forma como o poder público lida com o complexo desafio de conciliar o interesse coletivo na implantação da infraestrutura de transporte com os direitos individuais dos proprietários afetados.
Persistem, contudo, desafios significativos, especialmente quanto à transparência do processo, à adequação das indenizações e à mitigação dos impactos sociais das desapropriações. A continuidade do acompanhamento técnico, jurídico e social do processo permanece fundamental para garantir que o desenvolvimento urbano representado pela Linha Rosa ocorra de forma justa, equilibrada e sustentável.
Para advogados especialistas na área, o momento é de atenção redobrada às inovações jurisprudenciais e metodológicas, que têm potencial para redefinir parâmetros tradicionais do direito expropriatório brasileiro. A combinação de conhecimento jurídico específico com sensibilidade para os aspectos sociais e urbanos envolvidos será determinante para uma atuação profissional efetiva e socialmente responsável neste campo.
Otavio Andere Neto
Otavio é advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil desde 2003, com mais de 20 anos de experiência na condução de processos judiciais de alta complexidade. Ao longo de sua carreira, desenvolveu sólida expertise na elaboração de estratégias processuais inovadoras e na representação de clientes em disputas de grande envergadura perante as mais diversas instâncias do Poder Judiciário
