Execução Fiscal: Estratégias de Defesa Processual

Defesa em Execução Fiscal: Advogado especialista em Direito Tributário explica estratégias avançadas para evitar o bloqueio de contas, reverter penhoras e negociar dívidas com o Fisco.

A execução fiscal no Brasil é, frequentemente, o momento de maior tensão na relação entre o Fisco e o contribuinte, seja ele pessoa física ou jurídica. Não se trata apenas de uma cobrança, mas de um processo judicial agressivo, regido pela Lei nº 6.830/80 (LEF), que visa a satisfação de um crédito público já inscrito em Dívida Ativa (DA), materializado pela Certidão de Dívida Ativa (CDA).

Para o empreendedor, o recebimento de uma citação em execução fiscal dispara um alerta máximo, pois implica o risco imediato de bloqueio de bens, penhora e, em última instância, a inviabilização das atividades. Por isso, a defesa de execução fiscal se eleva a um patamar de importância estratégica, deixando de ser um mero formalismo processual para se tornar uma arte de preservação patrimonial e continuidade do negócio.

Este artigo, desvenda as principais teses defensivas, os instrumentos processuais cabíveis e as nuances jurisprudenciais que o contribuinte precisa conhecer para montar uma estratégia de defesa robusta e eficaz.

A Execução Fiscal em Xeque: Compreendendo o Início da Cobrança

O processo de execução fiscal tem como ponto de partida a Certidão de Dívida Ativa (CDA). A CDA goza de presunção relativa de liquidez e certeza, o que significa que, para o Juízo, o débito ali contido é, em princípio, válido e exigível. É essa presunção que confere ao Fisco um poder de coerção imediato, permitindo, por exemplo, o bloqueio de ativos via BacenJud (agora SisbaJud) logo nas fases iniciais.

A Força da CDA e o Ônus da Prova

A grande dificuldade para quem busca a defesa de execução fiscal reside em derrubar a presunção de legalidade da CDA. O ônus da prova de que o título executivo é nulo ou inexigível recai, majoritariamente, sobre o executado.

Exemplo Prático (Atualização Jurisprudencial): O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem reiterado a tese (Tema 294) de que a compensação tributária efetuada pelo contribuinte antes do ajuizamento da execução fiscal pode figurar como fundamento de defesa nos embargos à execução, a fim de ilidir a presunção de liquidez e certeza da CDA. No entanto, decisões recentes (Março de 2025) apontam uma controvérsia sobre a possibilidade de discutir créditos negados na esfera administrativa nos próprios embargos. A defesa moderna deve, portanto, estar atenta a essas nuances para escolher o momento e o instrumento corretos para pleitear a compensação.

Para que a CDA seja válida, ela precisa atender a requisitos formais rigorosos, previstos no art. 202 do Código Tributário Nacional (CTN) e no art. 2º, § 5º, da LEF. A falha em um desses requisitos abre uma das principais portas para a defesa de execução fiscal: a sua nulidade.

Os Pilares da Defesa de Execução Fiscal: Instrumentos Processuais

A legislação brasileira disponibiliza diferentes ferramentas para o contribuinte se defender na execução fiscal, sendo a escolha do instrumento correto crucial para a eficácia da estratégia.

Embargos à Execução Fiscal (O Principal Instrumento):

Os embargos são a principal via de defesa. Eles constituem uma ação autônoma (um processo dentro do processo) onde o executado pode apresentar todas as matérias de defesa que tiver, sejam elas de direito material (mérito da dívida) ou processual (forma do processo).

Requisito Indispensável: A Garantia do Juízo: Via de regra, os embargos à execução fiscal só podem ser opostos após a garantia integral do juízo, o que significa que o contribuinte deve oferecer bens ou valores suficientes para cobrir o total da dívida cobrada, acrescida de juros, multas e encargos.

Bens aceitáveis para garantia: Depósito em dinheiro, fiança bancária/seguro garantia, penhora de bens móveis ou imóveis, nomeação de faturamento (com cautela).

Controvérsia da Garantia Parcial (2025): Embora o entendimento majoritário exija a garantia integral, uma decisão recente (Março de 2025) da 2ª Turma do STJ reafirmou a possibilidade de processamento de embargos com garantia parcial quando demonstrada a incapacidade financeira momentânea do contribuinte, especialmente para micro e pequenas empresas. Esta é uma tese de vanguarda que deve ser explorada pela defesa de execução fiscal em casos de crise financeira comprovada.

Prazo: O prazo para a apresentação dos Embargos é de 30 (trinta) dias, contados da intimação da penhora ou do depósito (garantia).

Exceção de Pré-Executividade (A Defesa Sem Garantia)

A Exceção de Pré-Executividade (EPE) é uma defesa incidental, atípica e de construção essencialmente doutrinária e jurisprudencial. Sua principal vantagem é que dispensa a garantia do juízo.

Limite de Matérias:

A EPE só é cabível para alegar matérias que possam ser conhecidas de ofício pelo juiz e que exijam prova pré-constituída (documental).

Matérias Típicas da EPE:

  1. Prescrição (incluindo a prescrição intercorrente, muito debatida atualmente).
  2. Decadência.
  3. Ilegitimidade passiva (o réu não é o devedor correto).
  4. Nulidade manifesta da CDA (vício formal claro).
  5. Pagamento/Compensação (quando o documento é irrefutável).
  6. Alerta (Prescrição Intercorrente – 2025): Com base no Tema 566 do STJ e na Nota Técnica do CJF (2025), o prazo de prescrição de 5 anos inicia-se automaticamente após o decurso do prazo de 1 ano de suspensão da execução fiscal (quando o credor não localiza bens penhoráveis). Este é um argumento poderoso para a defesa de execução fiscal, pois muitas execuções antigas, paralisadas por anos sem o cumprimento correto dos requisitos da suspensão/arquivamento, podem ser extintas.

Petição Simples (Requerimento de Extinção)

Em casos de matérias de ordem pública supervenientes ou que exijam apenas a análise de documentos anexados aos autos pela própria Fazenda, o executado pode usar uma petição simples para requerer a extinção ou suspensão do processo.

Embargos de Terceiro

Este instrumento é vital para a defesa de execução fiscal de terceiros que não são o devedor, mas tiveram bens de sua propriedade ou posse atingidos pela penhora.

  • Cenário Comum: Ex-cônjuges, sócios retirantes que provam que a dívida é posterior à sua saída, ou adquirentes de boa-fé de um imóvel penhorado (Súmula 375 do STJ).

As Teses de Defesa Mais Poderosas (Otimizando a Estratégia)

A excelência na defesa de execução fiscal reside na identificação precisa do vício legal ou do erro fático. As teses abaixo representam os principais flancos de ataque contra a pretensão executória.

  1. Nulidade da CDA e Vícios Formais: A CDA é o “cheque” da Fazenda. Se for mal preenchida, é nula e a execução deve ser extinta.
  2. Ausência de Requisitos Legais: Falta de indicação do livro e folha da inscrição; ausência da fundamentação legal específica; ou omissão do termo inicial de juros e forma de cálculo.
  3. Alteração do Fundamento Legal (Tema Repetitivo STJ – Nov/2025): Em decisão recente (novembro de 2025), o STJ definiu que a Fazenda Pública não pode emendar ou substituir a CDA para alterar o fundamento legal do crédito tributário. Se a CDA indica, por exemplo, o recolhimento de uma contribuição, a Fazenda não pode, no curso da execução, emendá-la para cobrar o imposto de outra natureza. Isso garante a previsibilidade e o direito à ampla defesa do contribuinte.
  4. Prescrição e Decadência (A Extinção da Dívida)
São os argumentos mais desejados pela defesa, pois levam à extinção da obrigação principal por decurso do tempo.
  1. Prescrição (5 anos): O Fisco tem 5 anos para ajuizar a execução, contados da constituição definitiva do crédito (após o esgotamento do processo administrativo).
  2. Decadência (5 anos): O Fisco tem 5 anos para constituir o crédito, ou seja, para lançar o tributo.
  3. Prescrição Intercorrente (Regime do Art. 40 da LEF): Após a suspensão da execução por 1 ano (por falta de localização de bens), o prazo prescricional de 5 anos volta a correr automaticamente.

Estratégia Defensiva:

Muitas execuções fiscais ficam suspensas ou arquivadas por anos sem o devido protocolo de intimação do credor sobre a suspensão. A Lei nº 14.195/2021 tornou o regime mais objetivo. A defesa de execução fiscal deve analisar a data da primeira tentativa infrutífera de penhora ou localização para arguir a prescrição intercorrente.

Ilegitimidade Passiva e Redirecionamento da Execução

Esta tese é crucial para os administradores, sócios e terceiros que são incluídos na execução (redirecionamento).

  1. Redirecionamento ao Sócio/Administrador: A regra é clara: o redirecionamento só é lícito se o administrador ou sócio agiu com excesso de poderes, infração à lei ou ao contrato social, ou se ocorreu a dissolução irregular da empresa. A mera inadimplência tributária não é causa suficiente para o redirecionamento.
  2. Súmula 430 do STJ: “O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente.”
  3. Defesa Prévia (Decisão STJ – Set/2020): Os ministros do STJ garantiram o direito à defesa prévia do sócio antes que a execução seja redirecionada. O sócio tem o direito de ser intimado para se defender antes da efetiva penhora de seus bens.

Questões de Mérito da Dívida

Estas teses atacam a própria existência ou o valor do débito.

  1. Bitributação ou Bis in Idem: Cobrança do mesmo tributo, sobre o mesmo fato gerador, por diferentes entes federativos ou mais de uma vez.
  2. Inconstitucionalidade/Ilegalidade do Tributo: A cobrança é baseada em lei ou norma que viola a Constituição Federal ou leis federais.

Excesso de Execução:

O valor cobrado está incorreto devido a erros de cálculo, aplicação indevida de multas confiscatórias (multa punitiva acima de 100% tem sido vista com ressalvas pelo STF) ou juros incorretos.

O Impacto Estratégico da Defesa no Cenário Atual 

O cenário do contencioso tributário evoluiu significativamente, tornando a defesa de execução fiscal não apenas um ato de contestação, mas uma ferramenta de gestão estratégica.

A Transação Tributária e a Negociação

A Lei nº 13.988/2020, que trata da Transação Tributária, representou um divisor de águas. Hoje, a defesa de execução fiscal não se limita mais ao litígio, mas inclui a negociação estratégica.

  • Oportunidade: O contribuinte pode suspender ou extinguir a execução fiscal mediante um acordo com a Fazenda (União, Estados ou Municípios) que envolve descontos em multas e juros, e alongamento do prazo para pagamento, com o uso de precatórios ou créditos de prejuízo fiscal.
  • A Perspectiva da PGFN (2025): A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) tem intensificado a estratégia de cobrança, limitando o ajuizamento de execuções apenas quando há indícios de bens ou atividade econômica do devedor (Nota Técnica CJF 2025). Isso mostra que, para a Fazenda, o objetivo principal não é apenas interromper a prescrição, mas sim recuperar o crédito. A defesa deve usar isso como trunfo para buscar a transação, demonstrando a inviabilidade de recuperação pela via judicial tradicional.

A Relevância da Prova e da Perícia

Em teses de mérito, a prova é a rainha. A defesa de execução fiscal eficaz quase sempre envolve a necessidade de uma perícia contábil-fiscal.

  • Exemplo: Se a tese é de excesso de execução, o laudo pericial contábil é o único meio capaz de demonstrar, com precisão técnica, que o cálculo da Fazenda está errado, seja por aplicação de índices incorretos, seja por juros capitalizados ou multas indevidas.

Passos Práticos para a Defesa de Execução Fiscal

O contribuinte que recebe uma citação deve agir com rapidez e precisão.

Etapa

Ação Imediata

Foco e Objetivo

1

Análise da Citação e da CDA

Verificar: Prazo (5 dias para pagar/garantir), Valor (abaixo de R$ 10 mil?), e Requisitos formais da CDA (fundamentação legal, data de vencimento, etc.).

2

Identificação do Vício

Definir a tese primária: Prescrição/Decadência (Extinção Imediata), Nulidade da CDA (Vício Formal) ou Ilegitimidade Passiva (Sócio ou Terceiro).

3

Escolha do Instrumento

Se há prova pré-constituída (documental) e a matéria é de ordem pública: Exceção de Pré-Executividade (sem garantia). Nos demais casos: Embargos à Execução (com garantia).

4

Estratégia de Garantia

Definir o tipo de bem a ser oferecido: dinheiro (depósito), seguro garantia/fiança bancária (menos custoso ao fluxo de caixa) ou penhora de bens.

5

Monitoramento e Recursos

Acompanhamento do andamento, interposição de Agravo de Instrumento contra decisões interlocutórias de penhora e, se necessário, Apelação contra a sentença dos embargos.

Nota sobre Recursos (Art. 34 da LEF): Em execuções fiscais de baixo valor (até 50 ORTNs na época da LEF, valor que é atualizado), o recurso cabível contra a sentença pode não ser a Apelação, mas sim os Embargos Infringentes (embora o CPC/15 tenha alterado o regime geral, o art. 34 da LEF ainda gera discussões sobre o “valor de alçada”). Um advogado especialista deve sempre verificar o valor de alçada atualizado para garantir a via recursal correta.

Conclusão: A Importância da Especialização na Defesa de Execução Fiscal

A defesa de execução fiscal é um campo dinâmico do Direito Tributário, marcado por intensa atividade jurisprudencial e legislativa. O sucesso na lide contra o Fisco depende de uma análise minuciosa da CDA, da identificação das teses de mérito mais robustas (Prescrição, Ilegitimidade, Nulidade) e da escolha estratégica do instrumento processual adequado (Embargos, EPE, Transação).

Para o contribuinte, agir de forma reativa e sem especialização é um erro custoso, que pode levar à penhora de bens essenciais e à inviabilização financeira. A verdadeira vitória na execução fiscal não é apenas a extinção da dívida, mas a preservação da saúde financeira e da continuidade das operações empresariais. Acompanhar a evolução dos temas repetitivos do STJ (como o que rege a alteração da CDA, Nov/2025) e as novas regras de arquivamento (Tema 1184/STF) é fundamental para construir uma defesa de classe mundial.

Execução Fiscal: Estratégias de Defesa Processual

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Advocacia Especialista em

Valdir Gimenez

Valdir é Especialista em Direito Tributário, com mais de 20 anos de experiência em contencioso administrativo e judicial nas esferas federal, estadual e municipal. Atua com ênfase em consultoria, planejamento fiscal, reorganização societária e contabilidade tributária aplicada ao contencioso. Possui expertise na interpretação de normas tributárias complexas, assegurando estratégias sempre alinhadas à legislação vigente e à jurisprudência atualizada.

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