ITCMD na permuta de imóveis: Consulta Tributária nº 31.158/2025

A importância de compreender o ITCMD nas permutas

A permuta de imóveis é um instrumento amplamente utilizado no mercado imobiliário. Construtoras, incorporadoras e particulares realizam trocas de bens para viabilizar empreendimentos e reorganizar patrimônios sem a necessidade de desembolso imediato de dinheiro.

O problema surge quando a operação, embora chamada de permuta, não envolve bens de valores equivalentes. Nesses casos, a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo (Sefaz-SP) entende que há uma transferência gratuita de parte do patrimônio — o que configura doação e, consequentemente, gera a cobrança do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação).

O contexto da Resposta à Consulta nº 31158/2025

Em fevereiro de 2025, a Sefaz-SP publicou a Resposta à Consulta Tributária nº 31.158/2025, esclarecendo quando a permuta de imóveis passa a ser tratada como doação.

A consulta foi formulada por uma incorporadora imobiliária que havia celebrado, em 2024, uma permuta de imóveis urbanos. A operação envolvia bens de valores diferentes, e não houve pagamento de “torna”, ou seja, da quantia compensatória que equaliza o negócio.

Ao tentar registrar a escritura, o cartório exigiu a guia do ITCMD, entendendo que parte da operação representava uma doação. Diante disso, a empresa buscou esclarecimento da Fazenda sobre a incidência e a base de cálculo do imposto.

A resposta foi objetiva:

A permuta envolvendo imóveis de diferentes valores, realizada sem a devida compensação financeira, caracteriza uma doação.

Em outras palavras, sempre que a troca for desigual e não houver pagamento da diferença, a parte que recebe o bem de maior valor é considerada donatária e deve recolher ITCMD sobre o valor excedente.

O que é o ITCMD e quando ele incide

O ITCMD é um tributo de competência estadual, previsto na Lei nº 10.705/2000 e regulamentado pelo Decreto nº 46.655/2002 (RITCMD/SP). Ele incide sobre transmissões gratuitas de bens ou direitos, seja por herança (causa mortis), seja por doação.

A alíquota em São Paulo é de 4% sobre o valor transmitido. Quando a transmissão decorre de uma permuta sem contraprestação equivalente, o imposto incide apenas sobre a diferença entre os valores dos bens trocados.

Quando a permuta de imóveis gera ITCMD

Permuta de valores equivalentes

Quando os imóveis têm valores de mercado semelhantes, a operação é puramente onerosa. Nesse caso, não há ITCMD, apenas ITBI (imposto municipal sobre a transmissão onerosa).

Permuta com “torna”

Se houver diferença de valores, mas uma das partes paga a diferença à outra, trata-se de permuta com torna. A operação continua sendo onerosa e, portanto, sujeita apenas ao ITBI.

Permuta sem “torna” e com diferença de valores

Esse é o cenário analisado na RC 31158/2025. Quando a troca envolve imóveis de valores diferentes e não há compensação financeira, a parte beneficiada está recebendo vantagem patrimonial gratuita, configurando doação parcial. O ITCMD incide sobre o valor da diferença, e o contribuinte é o donatário — quem recebeu o bem de maior valor.

A base de cálculo do ITCMD na permuta

A base de cálculo do ITCMD, conforme o artigo 12 da Lei 10.705/2000 e o artigo 16 do Decreto 46.655/2002, é o valor venal de mercado do bem transmitido.
Esse valor nunca pode ser inferior ao utilizado para lançamento do IPTU ou ao valor venal de referência do ITBI municipal.

Assim, mesmo que as partes atribuam valores menores na escritura, a Fazenda pode desconsiderá-los e utilizar o valor de mercado para calcular o imposto.
O objetivo é evitar subavaliações e garantir que o ITCMD seja recolhido sobre o valor real da transferência.

Fundamentação jurídica do entendimento

A posição da SEFAZ-SP está amparada em três pilares normativos. Com base nesses dispositivos, a Fazenda entende que qualquer diferença patrimonial sem contraprestação é uma doação e deve ser tributada.

  1. Artigo 538 do Código Civil
    Define que doação é o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere bens ou vantagens para o patrimônio de outra.

  2. Artigo 1º, § 5º do Decreto nº 46.655/2002 (RITCMD/SP)
    Determina que o ITCMD incide sobre transmissões “inter vivos” realizadas por doação ou liberalidade, ainda que inseridas em contratos de outra natureza.

  3. Artigos 12 e 13 da Lei nº 10.705/2000
    Fixam o valor venal de mercado como base de cálculo e impedem a adoção de valores inferiores aos de IPTU ou ITBI.

O impacto no mercado imobiliário

O entendimento da RC 31158/2025 tem reflexos diretos sobre o mercado imobiliário paulista. A permuta é um instrumento essencial para incorporadoras e construtoras, especialmente na aquisição de terrenos mediante troca por unidades futuras.

Se o valor das unidades entregues não for exatamente equivalente ao do terreno, e não houver torna, a Fazenda poderá exigir o recolhimento de ITCMD sobre a diferença. O mesmo raciocínio se aplica às permutações entre holdings patrimoniais, comuns em reestruturações empresariais e sucessões familiares.

Exemplo prático: permuta entre incorporadora e particular

Imagine uma incorporadora que troca duas unidades em construção, avaliadas em R$ 145 mil no total, por um apartamento pronto de mesmo valor declarado.
Embora os valores na escritura sejam iguais, o imóvel pronto tem valor de mercado superior.

Na ótica da SEFAZ-SP, essa diferença representa doação parcial, pois a incorporadora recebeu mais patrimônio do que entregou, sem pagar nada pela diferença.
O imposto incidiria sobre o valor dessa vantagem econômica.

ITCMD e ITBI: diferenças fundamentais

O ITCMD e o ITBI muitas vezes se confundem, mas têm naturezas distintas:

ImpostoFato geradorNaturezaCompetênciaAlíquota média
ITCMDTransmissão gratuita (doação/herança)GratuitaEstado4%
ITBITransmissão onerosa (compra e venda, permuta com torna)OnerosaMunicípio2% a 3%

Assim, permuta onerosa gera apenas ITBI, enquanto permuta gratuita parcial (sem torna) gera ITCMD sobre a diferença de valores.

O poder de fiscalização da Fazenda

A Sefaz-SP possui competência para verificar a veracidade dos valores declarados e exigir provas da equivalência.
Se identificar omissão ou inexatidão, pode arbitrar o valor de mercado com base em laudos ou dados de referência, conforme o artigo 149 do Código Tributário Nacional.

Essa prerrogativa reforça a necessidade de transparência na elaboração dos contratos e escrituras, especialmente quando os imóveis estão em diferentes estágios de construção ou possuem características distintas.

Conclusão: igualdade de valores é a chave para evitar ITCMD

A Resposta à Consulta Tributária nº 31158/2025 reforça um princípio simples, mas crucial: na permuta de imóveis, só há isenção de ITCMD quando há equivalência de valores ou compensação financeira.

Qualquer diferença patrimonial sem pagamento configura doação e atrai a incidência do imposto. Por isso, é fundamental que advogados, contadores e incorporadoras revisem seus modelos de contrato e adotem documentação técnica capaz de comprovar a justa equivalência entre os bens trocados.

Em resumo, o cuidado preventivo é o melhor caminho para garantir segurança jurídica, evitar autuações e assegurar economia tributária em operações imobiliárias e societárias.

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Advocacia Especialista em

Otavio Andere Neto

Otavio é advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil desde 2003, com mais de 20 anos de experiência na condução de processos judiciais de alta complexidade. Ao longo de sua carreira, desenvolveu sólida expertise na elaboração de estratégias processuais inovadoras e na representação de clientes em disputas de grande envergadura perante as mais diversas instâncias do Poder Judiciário

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